nós somos aqueles por quem esperávamos - instituto de desenvolvimento regenerativo

Nós somos aqueles por quem esperávamos

Já é hora de superarmos a nossa apatia e assumirmos o nosso papel na criação do mundo em que queremos viver

Este é o primeiro texto de uma sequência de cinco artigos que nos convoca a assumir o papel de ativistas radicais a serviço da construção de um mundo viável. A sequência é: Nós somos aqueles por quem esperávamos, O paradoxo do ativismo conservador, O ativismo radical, Como vemos o mundo? e Como as mudanças acontecem?. Acompanhe e assuma a sua identidade enquanto agente de transformação neste mundo em transição.

O sistema político está entregue ao sistema econômico e este, por sua vez, está dissociado do mundo natural – sua única fonte de legitimidade e valor. Temos, então, um espaço social aberto para ações revolucionárias. Mas, muitos de nós, secretamente, temos uma certa nostalgia de regimes autoritários e daquelas ações governamentais impetuosas que, no imaginário coletivo, eram capazes de “resolver os problemas da sociedade”.

Temos saudades de uma vida mais restrita porque fomos acostumados a não acreditar em nosso potencial transformativo. Desejar um mundo melhor sempre foi considerado uma transgressão em um contexto em que se acredita que somos pequenos demais para promover mudanças sociais.

Comumente, nos sentimos insultados quando somos requisitados a participar ativamente da criação do mundo. No íntimo, dizemos a nós mesmos que não temos condições de nos responsabilizar pelos caminhos que o mundo toma. Para evitar a nossa auto-responsabilização incorporamos o sonho de que alguém resolverá as coisas para nós e tornamos dispensável o nosso poder frente à sociedade.

“Nós não nos preocupamos em votar e quando nos preocupamos votamos em candidatos que não abordam os problemas reais esperando (contra toda a experiência anterior) que eles vão de repente acordar e agir corajosamente para nos salvar.” — Joanna Macy

Desse modo, a espera resignada pela salvação continua sendo a nossa fonte de esperança frente os desafios do mundo. E continua recriando paralisia e retrocesso. Continuamos elegendo figuras políticas que ameaçam direitos e de quem se espera a salvação nacional que uma pessoa sozinha nunca foi e jamais será capaz de alcançar. Enquanto esperamos a salvação sofremos as consequências que produzimos com o nosso hábito de terceirizar a mudança a quem retoricamente a promete.

Compactuamos em fingir que estamos desempoderados aos assumirmos equivocadamente que não impactamos uns aos outros e que não fazemos diferença na vida uns dos outros. Vivemos as nossas vidas particulares compartilhando um mesmo mundo, mas negligenciando o que a vida em sociedade significa.

Dessa forma, construímos o cenário atual de apatia social generalizada. Desconhecemos a sensação de pertencimento que surge quando fazemos algo que transforma a realidade de alguém ou de um lugar. Pouco desfrutamos do contentamento que nasce quando fazemos algo que faz sentido porque tocou alguém e ancorou um valor importante no mundo.

Diante as tragédias ecológicas e sociais pouco nos importamos porque assumimos que não temos capacidade de fazer algo que faça diferença. Tentando garantir nossa zona de conforto e afastar a culpa pela nossa falta de engajamento, assumimos que elas não nos dizem respeito.

No entanto, o mundo social só passa a ter vida na medida em que passa a pertencer às pessoas que o compõem. Dada a natureza social do ser humano, uma vida humana que faz sentido é aquela em que sentimos, visceralmente, que nossa existência faz diferença na existência dos outros.

Para tornar isso praticável precisamos pegar de volta nosso enorme poder de construir o mundo em que queremos viver. A salvação política, econômica, social, ecológica etc. não vai vir de ninguém que não nós mesmos. Nós somos aqueles por quem esperávamos. Seremos salvos por nós mesmos com esforço coletivo e altruísta, com preocupação sincera e engajada pela vida das comunidades humanas e dos ecossistemas – de todos eles.

Constatarmos que há uma angústia generalizada diante as incertezas próprias do mundo complexo em que vivemos – associadas ao desejo de que alguém mude o rumo do mundo – é um primeiro passo. Diante disso, nossa tarefa é buscar as causas e condições por trás desse comportamento e tomar a tendência à terceirização da mudança como ponto de partida para reflexão e intervenção.

Na aldeia Oraibi, da Nação Hopi, há muitos anos, um ancião convidou o seu povo ao engajamento e participação consciente na cocriação do mundo. Sua mensagem é tão atual como nunca. Ele proferiu:

“Você disse ao povo que esta é a décima primeira hora

Agora você deve voltar e dizer às pessoas que esta é a hora

E que há coisas a serem consideradas

Onde você está morando?

O que você está fazendo?

Quais são os seus relacionamentos?

Você está em relações corretas?

Conheça o seu jardim

É hora de falar a sua verdade

Sejam bons uns com os outros

Não procure o líder fora de si mesmo

Então, ele apertou as mãos, sorriu e disse: “Este poderia ser um bom momento”

Há um rio que agora flui muito rápido

É tão grande e rápido que há aqueles que terão medo

Eles tentarão se manter às margens

Eles sentirão que estão sendo dilacerados e sofrerão muito

Mas saiba que o rio tem o seu destino

Os mais velhos dizem:

“Temos que deixar a margem, ir para o meio do rio, manter os olhos abertos e as nossas cabeças acima da água”

E eu digo: “Veja quem está lá dentro com você e celebre”

Neste momento da história não devemos tomar nada como pessoal

Muito menos a nós mesmos

No momento, o que fazemos, o nosso crescimento espiritual e viagem chegam a um impasse

O tempo do lobo solitário acabou

Reúnam-se

Eliminem a palavra luta de sua atitude e de seu vocabulário

Tudo o que fazemos agora deve ser feito de uma maneira sagrada e em celebração

Nós somos aqueles por quem temos esperado!”

Nas próximas partes desta sequência de textos vamos jogar luz ao modo como temos atuado no mundo. Podemos sintetizar nossos esforços direcionados à mudança social em três grandes grupos: dos apáticos e desinteressados, dos ativistas conservadores e dos ativistas radicais. Acompanhe os próximos artigos para identificar qual o seu modo de atuar no mundo e se inspirar na proposta do ativismo radical.

Este texto foi inspirado pelas reflexões de Dominic Barter presentes em cinco vídeos gravados para o canal Viva Melhor em 2016: Cocriando o mundo; Para fazer bonito; Processos; Diálogo com a escola e a justiça; A Não-violência assume a vida.

Referências:

Os Anciãos da Aldeia Oraibi, Arizona, Nação Hopi. A 11ª Hora, Profecia de um Ancião Hopi.

Dominic Barter (2016). Cocriando o mundo. Canal Viva melhor.

Dominic Barter (2016). Para fazer bonito. Canal Viva melhor.

Dominic Barter (2016). Processos. Canal Viva melhor.

Dominic Barter (2016). Diálogo com a escola e a justiça. Canal Viva melhor..

Dominic Barter (2016). A Não-violência assume a vida. Canal Viva melhor.

Posted by Juliana Diniz

Através da conciliação entre desenvolvimento humano e social e a inteligência dos sistemas vivos, facilito processos de aprendizagem e transformação pessoal e coletiva que promovam a saúde planetária e protejam a memória biocultural da Terra.

1 comment

Join the reGeneration! 🙂 the old Hopi prophesy ends with “We are the ones we have been waiting for!” https://medium.com/insurge-intelligence/join-the-re-generation-designing-regenerative-cultures-77f7868c63cd

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