A sustentabilidade tecnológica e a sustentabilidade ecológica são frutos de duas visões de mundo distintas: a mecanicista e a ecológica.
Há uma mudança de mentalidade em curso, que parte de uma visão de mundo mecanicista e chega a uma visão de mundo ecológica (CAPRA e LUISI, 2014). Esta mudança é, essencialmente, uma mudança de metáforas: de uma que vê o mundo como uma máquina para uma que o entende como uma rede.
Capra e Luisi (2014) descrevem esta mudança como uma tensão básica entre as partes e o todo. A ênfase nas partes tem sido chamada de mecanicista, reducionista ou atomista; a ênfase no todo de holística ou ecológica. Na ciência do século XX, a perspectiva holística tornou-se conhecida como “sistêmica”, e a forma de pensar que esta implica de “pensamento sistêmico”.
A mudança paradigmática é acompanhada de diversos desafios. Modelos mentais antigos e crenças solidificadas geralmente funcionam como um fator de resistência e como um “bloqueador mental” para novas concepções.
Porém, como Meadows (1997) discute em seu artigo Leverage Points: Places to intervene in a system, a melhor forma de mudar um sistema ocorre justamente mudando o modelo mental ou paradigma do qual este sistema surge.
Você poderia dizer que paradigmas são mais difíceis de mudar do que qualquer outra coisa em um sistema, e que, portanto, este item deveria ser o último da lista, e não o primeiro. Mas não há nada físico ou dispendioso ou até mesmo lento sobre mudança de paradigmas. Em um indivíduo ela pode ocorrer em um milissegundo. Tudo o que precisa é um clique na mente, uma nova forma de enxergar. É claro que os indivíduos e a sociedade são mais resistentes a desafiar seus paradigmas do que são com qualquer outra forma de mudança. (MEADOWS, 1997).
Um paradigma provê um modelo ou padrão aceitável de ideias e premissas básicas — oriundas do contexto de sua visão de mundo — sobre como algo deve ser percebido, pensado, avaliado, feito ou fabricado (HARMAN, 1970 apud BENNE e MANG, 2015).
Com base nas visões de mundo em que são gestados, o desenvolvimento e o design sustentável podem ser divididos em duas grandes vertentes — uma tecnicista, baseada na engenharia e focada em eficiência, chamada de sustentabilidade tecnológica; e outra baseada na ecologia e nos princípios dos sistemas vivos, chamada de sustentabilidade ecológica (MANG e REED, 2012).
Assim, a sustentabilidade tecnológica e a sustentabilidade ecológica são frutos de dois paradigmas distintos: o mecanicista e o ecológico (BENNE e MANG, 2015).
A sustentabilidade tecnológica
O paradigma tecnológico da sustentabilidade definiu e continua a definir as regras e padrões dominantes para a pesquisa e a prática da sustentabilidade moderna. Este paradigma está fundamentado na premissa de que os desafios socioecológicos são problemas tecnicamente complicados que podem ser resolvidos através do poder ilimitado da ciência e tecnologia (BENNE e MANG, 2015).
Esta abordagem reflete a crença de que os sistemas vivos e os sistemas mecânicos são governados pelas mesmas leis e que podem ser entendidos, administrados e “consertados” através dos mesmos métodos.
O paradigma da sustentabilidade tecnológica tem como objetivo alcançar e manter um estado ótimo e constante de qualidade ambiental, social e econômica (BENNE e MANG, 2015) e pode ser sintetizada a partir da crença de que “o desempenho da sustentabilidade do todo é otimizado ao agregar as soluções para as diferentes partes” ou, “ao otimizar a eficiência dos elementos individuais constituintes de um sistema ao identificar requerimentos de desempenho discretos, definir objetivos mensuráveis e seguir fórmulas, regras e critérios pré estabelecidos, otimizamos também a eficiência do todo” (BENNE e MANG, 2015, p. 44).
Os projetos executados a partir desta abordagem são majoritariamente pensados fora de contexto sem que haja uma consideração sobre os relacionamentos socioecológicos locais e sobre as especificidades locais e biorregionais.
A sustentabilidade ecológica
Já o paradigma da sustentabilidade ecológica surgiu a partir de um crescente interesse nas abordagens ecológicas do design na década de 1990 (MANG e REED, 2012). Ela está fundamentada na premissa de que “as atuais ameaças para a sustentabilidade são problemas complexos que dependem da transformação dos seres humanos e suas atividades para uma relação harmoniosa e mutuamente benéfica com a teia da vida e, assim, restaurar a capacidade regenerativa inerente dos sistemas vivos naturais e sociais” (BENNE e MANG, 2015, p. 45).
A partir deste paradigma, a sustentabilidade é definida como a capacidade de um sistema vivo, em um ambiente de contínua mudança, manter seu propósito e integridade em uma relação recíproca com o sistema maior em que está aninhado. A sustentabilidade é uma propriedade emergente que surge da interação das soluções sociais, econômicas e ecológicas (DU PLESSIS, 2012 apud BENNE e MANG, 2015).
As estratégias para se projetar a partir da abordagem ecológica, ou regenerativa, buscam criar condições que possibilitem toda a vida em um lugar, incluindo os humanos, prosperar e evoluir através do tempo. As soluções regenerativas são específicas a um dado lugar e requerem um profundo entendimento das interdependências dos sistemas socioecológicos locais. Os humanos são vistos como parceiros cocriadores e participantes na evolução da natureza (BENNE e MANG, 2015).
Referências
BENNE, B.; MANG, P. Working regeneratively across scales—insights from nature. Journal of Cleaner Production, p. 42-52, 2015.
CAPRA, F.; LUISI, P. L. The Systems View of Life: A Unifying Vision. Cambridge University Press, 2014.
MANG, P.; REED, B. Regenerative Development and Design. Encyclopedia Sustainability Science & Technology, p. 1–44, 2012.
MEADOWS, D. Leverage Points: Places to Intervene in a System. Whole Earth, 1997.
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