Sinergias entre o desenvolvimento regenerativo e os ensinamentos de E. F. Schumacher
“Sob um ponto de vista econômico, o conceito central da sabedoria é a permanência. Temos de estudar a economia da permanência. Nada faz sentido economicamente salvo se sua continuidade por longo tempo puder ser projetada sem incorrer em absurdos. Pode haver ‘crescimento’ rumo a um objetivo limitado, mas não pode haver crescimento ilimitado e generalizado.” — E. F. Schumacher
A preocupação com a longevidade dos empreendimentos humanos também está no cerne do desenvolvimento regenerativo, afinal regeneração é sobre aumentar o potencial ou recuperar a vitalidade perdida de um sistema vivo.
Ao liderarmos ou apoiarmos um projeto, a lente do desenvolvimento regenerativo sempre nos leva a perguntar:
Quais condições devemos criar no projeto, no lugar do projeto e nos atores envolvidos para que eles sigam se desenvolvendo e realizando novos potenciais mesmo após a nossa saída?
Que tipo de intervenção devemos fazer para que eles cresçam para além da nossa contribuição inicial?
Isso porque seguir existindo é o imperativo da vida.
Quando temos essa premissa em mente, cuidar para que os projetos, seus lugares e comunidades possam resistir a adversidades e seguir evoluindo ao longo do tempo é imprescindível. Essa ideia está incorporada no princípio: Projete para a evolução.
“Projetar para a evolução não significa projetar a evolução. A evolução é um processo emergente — que surge de múltiplas interações entre os seres vivos e seus ambientes. Não podemos projetar ou prever resultados específicos da evolução, mas podemos criar condições favoráveis à evolução que influenciam a trajetória e a velocidade da mudança.” — Pamela Mang e Ben Haggard
Projetar para a evolução é uma diretriz de design que incorpora nos projetos os princípios de evolução e desenvolvimento presente nos sistemas vivos. As iniciativas que adotam essa diretriz no seu planejamento estratégico buscam se tornar resilientes e viáveis nos sistemas maiores onde atuam e do qual dependem, aprimorando continuamente sua capacidade de contribuição.
Essa direção permite aos empreendimentos buscar pelo aumento de eficiência operacional e margem de lucro sem perder de vista outros tipos de objetivos. Isso é importante porque, como lembra Schumacher, “pode haver ‘crescimento’ rumo a um objetivo limitado, mas não pode haver crescimento ilimitado e generalizado”.
Crescimento e expansão são aspectos do desenvolvimento, mas os processos de desenvolvimento e evolução que garantem a existência de um sistema vivo não se resumem a eles. Em muitos momentos da trajetória de vida de um sistema vivo como uma planta ou ser humano, bem como de uma empresa ou organização, para se desenvolver, é preciso parar de crescer e se envolver em processos de uma natureza diferente.
Desenvolvimento e evolução em um projeto, muitas vezes, envolvem transformações na estrutura de funcionamento, investimento em resiliência e inovação que implica pensar em ganhos de valor em sistemas para além de si mesmo, e (mais difícil de realizar) mudanças qualitativas como a ressignificação do propósito da própria existência e, consequentemente, da direção estratégica que informará o futuro.
Então, quando pensamos em viabilidade, estamos pensando na gestão de recursos que garantirão a reprodução do projeto, sem restringir o olhar a indicadores financeiros e vantagens competitivas, enfatizando as condições e capacidades que precisam ser construídas no projeto e no seu entorno que lhes permitirão expressar maior vitalidade e capacidade de evolução.
Em um mundo mudando vertiginosamente, muitos empreendimentos começam sendo viáveis e deixam de ser em um dado momento. É natural que as circunstâncias que fizeram algo ser viável deixem de existir e, com isso, um projeto que surgiu associado a essas circunstâncias também perca a sua viabilidade e razão de ser.
Esse é o caso de inúmeras livrarias que, frente ao mercado online de livros e ebooks e o monopólio exercido por corporações como a Amazon, descobrem um novo propósito para si que recupera aspectos da sua motivação inicial enquanto se adapta ao novo cenário. Em Uberlândia, a Sabiá Livros deixou de ser uma restauradora e loja de livros para ser isso e mais: um sebo-café, em um bairro carente desse tipo de estabelecimento, que promove a cultura através de feiras aos fins de semana que incentivam a arte, a leitura e a convivência.
Olhar para a viabilidade de uma iniciativa tendo em vista os ensinamentos de E. F. Schumacher e do desenvolvimento regenerativo nos leva a investigar aspectos que passam despercebidos pelas análises de mercado mais convencionais:
O que confere vitalidade a essa iniciativa? Como ela expressa o seu espírito?
Uma vez que a iniciativa comece a expressar uma baixa de vitalidade, seja por alcançar os objetivos que se propôs ou por não conseguir ultrapassar limites circunstanciais que se impuseram, podemos perguntar:
O que nós (à frente da iniciativa) realmente queremos fazer? E o que queremos fazer agora? O que faz sentido de continuar fazendo?
Como podemos aumentar a capacidade da iniciativa gerar valor para os sistemas de que participa ou a que serve? O que regenerará o espírito desta iniciativa?
Qual mudança qualitativa precisamos atravessar já que crescer na direção estabelecida já não é mais possível ou não faz mais sentido?
Em breve iniciamos o grupo de estudos do livro Small is beautiful de E. F. Schumacher. O Small é especial porque reúne algumas das primeiras críticas ao modelo de desenvolvimento econômico moderno e constrói, de forma antecipada e ousada, uma visão de sociedade mais justa, ecológica, sábia e elegante.
Estamos animados e honrados com a oportunidade de, em grupo e de forma dialógica, reconectar com ideias que estão na base de diferentes movimentos relacionados à justiça social e ecológica e às novas economias.
Saiba mais e participe com a gente!