Nós estamos em um rito de passagem

Uma das qualidades dos ritos de passagem é a de não se poder saber o que esperar do outro lado do limiar cruzado e nem se ele conseguirá ser, de fato, ultrapassado. 

Com essa definição é fácil assumir que, enquanto espécie, nós estamos atravessando um rito de passagem. Para Daniel Wahl, consultor em inovação transformativa e autor do aclamado Design de Culturas Regenerativas, do outro lado do ponto de inflexão há a possibilidade de abundância colaborativa ou de escassez competitiva.

Nós estamos em cima do limiar. Precisamos cruzar a crise climática, o atentado anti-democrático, a negligência com a vida humana e não-humana. No cenário atual de pandemia, mais do que nunca, algumas saídas podem ser avistadas. Ainda sim, uma enorme vontade pessoal e social precisa ser reunida se quisermos enfrentar os desafios globais de peito aberto e com visão ampla. 

Em todo caso, de sucesso ou de fracasso no cruzamento do limiar, durante o rito que se estende no tempo, há a realidade inevitável de colapso do mundo ocidental moderno colonial globalizante e experiências inexplicáveis de sofrimento humano e não-humano.

Há um provérbio africano que diz “se você quer ir rápido, vá sozinho; se você quer ir longe, vá acompanhado”. Por isso, embora muitos ritos cerimoniais de passagem sejam solitários, eu acredito que em um momento como este, de crise civilizatória e colapso da ecologia planetária, nós precisamos — nas palavras do provérbio africano — ir longe e rápido. 

Precisamos adentrar nas profundezas da alma para encontrar potenciais subutilizados e precisamos, para isso, de uma comunidade que nos suporte e incentive. Além disso, carecemos de uma visão de mundo baseada em uma ética de cuidado com a vida que sirva de estrela-guia enquanto buscamos o nosso papel singular no mundo em crise.

Retirar-se temporariamente de um mundo demasiadamente agitado, abrir mão do fazer automatizado e adentrar uma jornada em busca de orientação são gestos que servem ao propósito de reunir a motivação e encontrar os meios apropriados para o engajamento compassivo e comprometido com a realidade à nossa volta. 

De algum modo, nós precisamos abdicar do conforto cotidiano, renunciar os estigmas sociais e soltar as exigências pessoais a fim de descobrirmos como o mundo interno configura circunstâncias externas e como podemos servir à transformação pessoal e à mudança social.

Com a suspensão temporária de quem acreditamos ser surge, então, a possibilidade da descoberta de quem somos e de quem podemos nos tornar pessoal e socialmente. Ao conviver com as perguntas que são feitas intimamente em ritos de passagem — quem sou eu?, o que eu tenho a oferecer?, como eu posso servir minha comunidade?, como curar minhas feridas? e como deixar hábitos que não me servem mais? — demandas socialmente adquiridas e limites auto-impostos podem ser transgredidos. 

De repente, nos descobrimos participantes indispensáveis do tecido da vida, entramos em nossa verdadeira natureza, nos tornamos o que nascemos para ser e contribuímos para que o mundo também possa cruzar seu limiar em direção a um cenário de mais saúde, beleza e vivacidade.

Este é um fragmento do artigo Sobre a busca de visão.

Saiba mais sobre o Em Busca da Visão — um percurso de autodesenvolvimento para revelar o seu eu autêntico e esclarecer a sua melhor contribuição para um mundo mais vivo e humano.

Posted by Juliana Diniz

Através da conciliação entre desenvolvimento humano e social e a inteligência dos sistemas vivos, facilito processos de aprendizagem e transformação pessoal e coletiva que promovam a saúde planetária e protejam a memória biocultural da Terra.

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