Entre o otimismo superficial e o realismo desanimador

Foto: Vincent Van Zalinge

Recentemente li um desabafo da Nora Bateson em que ela falava da “complexidade e enormidade do emaranhamento sistêmico das situações desta era”.

Na experiência dela, na minha, e imagino que na sua também, é difícil não ficar desmoralizado diante da obscuridade que se apresenta no mundo.

A sensação de estar sem saída e de não estar contribuindo de forma significativa e o desânimo por não ter perspectivas de futuro seguras e animadoras são recorrentes na experiência de quem busca viver e trabalhar com responsabilidade e sentido.

Às vezes somos bem sucedidos ao tentar incorporar soluções inteligentes e produzir impacto positivo onde atuamos. E muitas vezes somos frustrados nas nossas tentativas de fazer diferente, buscando agir com mais propósito, mais estratégia, mais envolvimento, mais articulação.

Para quem se vê nessa seara, são dois os desafios. Não ceder ao realismo desanimador, nem se deixar encantar pelo otimismo superficial e pela falsa esperança.

Para Nora Bateson, nada é tão prejudicial para nós e nossos contextos quanto as respostas que surgem de avaliações estreitas dos cenários complexos onde estamos metidos. Nenhuma posição é tão perigosa, ela diz, quanto o otimismo que surge de uma compreensão inadequada do entrelaçamento dos equívocos, estruturas e crises instaurados a nossa volta.

Ela insiste que, embora apostar em uma solução e se mobilizar para “fazer algo” possa trazer esperança e reforçar nossa coragem, “os esforços de resposta não sistêmica perpetuam e inevitavelmente pioram as consequências e as consequências das consequências”.

O que fazer então?

Acredito que a saída não seja ficarmos parados até que, em algum momento, surja a compreensão adequada da questão em pauta e nos vejamos preparados para agir.

Enquanto estamos vivos, estamos nos movendo. Embora seja sempre fundamental, nem sempre é possível parar e observar demoradamente. Na maioria das vezes, pegamos o bonde andando e é em meio ao caos e ao movimento que somos desafiados a fazer nossa melhor contribuição.

O ponto, então, é desconfiar da ação apressada, enviesada, que parece necessária porque surge da urgência. Avaliações rápidas produzem resultados correspondentes: eles aliviam os sintomas do momento e geram consequências não intencionais a longo prazo.

O desafio é encontrar um caminho que não reduza a nossa agência e não mine o potencial de alcançar resultados além do que conseguimos enxergar e do alcance das nossas pernas.

Nora diz ter visto repetidamente que, “diante do impossível, organismos vivos como você e eu nos tornamos criativos, encontramos um caminho… contra todas as probabilidades”.

Há possibilidades nos esperando em meio à complexidade dos projetos, das organizações, das comunidades, dos territórios, mas elas podem não se parecer com o que estamos procurando.

Acredito que abordagens não convencionais que se apoiam em formas contra-intuitivas de proceder são algumas joias que estão nos esperando. Elas não vão nos dar as capacidades técnicas e os modelos salvadores que buscamos para resolver os pepinos cotidianos, mas nos farão colocá-los em perspectivas e abordá-los de um outro lugar: de maior entendimento e com motivação renovada.

Isso me faz pensar que o olhar sistêmico e integral com que o desenvolvimento regenerativo está comprometido é o remédio amargo que pode cuidar dos hábitos danosos das pessoas com seus projetos e lugares. Provavelmente, não vai aliviar os sintomas imediatos nem resolver os problemas operacionais. Para isso há outros recursos. Mas, certamente, vai oferecer uma direção para restabelecer a saúde dos sistemas em questão, equilibrando intenções genuínas e impactos duradouros, esforços bem pensados e efeitos gratificantes.

É essa aposta que nos leva à 6ª edição da Capacitação em Desenvolvimento Regenerativo. De março a junho, estaremos juntos para aprender e experimentar o pensamento vivo aplicado ao planejamento estratégico de projetos de impacto. Será uma alegria ter você com a gente!

Posted by Juliana Diniz

Através da conciliação entre desenvolvimento humano e social e a inteligência dos sistemas vivos, facilito processos de aprendizagem e transformação pessoal e coletiva que promovam a saúde planetária e protejam a memória biocultural da Terra.

1 comment

Tânia Helena Alvares

Saudades lindeza. Amei!!!

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