Conversamos com a Juliana Schneider, fundadora da Escola Schumacher Brasil, sobre liderança, transição, risco, ciências holísticas e mais coisas no meio do caminho.
22
set
2019
Algo é certo quando tende a preservar a integridade, a estabilidade e a beleza da comunidade biótica. É errado quando tende de outra maneira. — Aldo Leopold
O mundo precisa de vozes comprometidas a honrar a evolução da vida na Terra.
Honrar a evolução significa estar atento e cuidar dos processos que criam condições propícias à vida.
A atenção, nunca antes tão furtada, é uma construção coletiva. É o resultado de interações com pessoas que possuem voz.
Precisamos, então, amplificar as vozes das pessoas que nos lembram do que é essencial e importante.
Precisamos de vozes comprometidas em contribuir para a transição de um mundo de crescimento industrial para uma sociedade que sustenta a vida.
E é por isso que criei o Podcast do IDR — um espaço de voz, lembrança e aprendizado.
E é por isso que você deveria começar o seu próprio canal de diálogo.
Foto: Clem Onojeghuo
Qual a diferença entre um planeta com vida em sua superfície e um planeta vivo?
Um planeta com vida em sua superfície está reduzido à escala humana. Um planeta vivo possui agência e transcende o tempo e espaço humano.
Um planeta com vida serve à evolução de seus habitantes. Um planeta vivo é o resultado da evolução em simbiose com aqueles que o habita.
Um planeta com vida em sua superfície é um depósito de recursos. Um planeta vivo é mãe e templo sagrado.
A forma como enxergamos a Terra muda a forma como interagimos com ela.
Estamos trabalhando em um planeta com vida em sua superfície ou em um planeta vivo?
Foto: Felipe Tavares
Uma ferramenta sistêmica para a mudança de ordem
O principal objetivo de atividades estruturadas é a mudança de ordem. Precisamos transformar algo simples em algo mais complexo e ordenado. Ao cozinhar transformamos alimentos não preparados em uma refeição. Ao tecer fazemos de fios tramas complexas e úteis. Atividades cognitivas seguem a mesma lógica: conferimos sentido à símbolos e transformamos percepções em aprendizados. Estas atividades são estruturadas. Elas possuem uma intenção clara e são organizadas para que uma mudança ocorra.
Acontece que geralmente lidamos com os nossos projetos, como empreender ou se formar, com pouca clareza e orientação. E isso é meio caminho andado para resultados abaixo da nossa expectativa.
As crises ecológica, social e econômica não são crises distintas e separadas, mas diferentes expressões de uma só: a crise de percepção.
Vivemos um paradoxo: nos orgulhamos da racionalidade humana e dos feitos tecnológicos, mas é esse mesmo pensamento a causa dos nossos maiores problemas. Esta é a tese central do autor Fritjof Capra e de outros pensadores.
A mentalidade dominante da sociedade hoje possui origem no encantamento com a máquina. Esta foi uma grande novidade e motivo de fascínio: “um instrumento grandioso fruto da racionalidade humana que irá solucionar muitos problemas e aliviar o sofrimento das pessoas”. Hoje, essa abordagem ainda sustenta manchetes como “Esta gigantesca máquina que remove CO2 do ar poderá transformar a luta contra a mudança climática”.
O seu projeto não é apenas um projeto. Não é a soma das plantas baixas das suas edificações e nem o conjunto de suas diretrizes internas. Não é a sua cadeia de produção e nem o serviço que você presta.
A sua empresa ou organização não é apenas isso: uma empresa ou uma organização. Ela é a expressão última do seu ser. É o reflexo das suas percepções básicas sobre o mundo, das suas ideologias invisíveis e do seu sistema de crenças. Ela é a sua assinatura energética, a sua declaração de visão e o seu voto de confiança. É a sua maior contribuição para o futuro que você ajuda a construir hoje.
O seu projeto é muito mais do que um projeto. É o seu veículo de liderança, o seu instrumento para a transformação e o seu desejo revelado. É a história que você conta e é o que diz para o mundo sobre as histórias que você acredita. O seu projeto é a sua revelação, é a sua história, as marcas da sua evolução e a trilha da sua caminhada.
A todo momento precisamos escolher. Hoje você pode escolher contar uma nova história. Pode reinventar o seu projeto e transformar o seu futuro. Pode alinhar a sua ação com aquilo que você acredita que há de melhor em você. Pode começar a construção do legado que amanhã irá te orgulhar.
Foto: Quino Al
Não só fazemos parte de uma teia viva como o planeta em si é uma entidade viva: Gaia. Essa percepção nos dá uma nova motivação enquanto sociedade. Os nossos dons e talentos — cultura e tecnologia, por exemplo — ganham um novo sentido.
Não mais temos que impor o nosso design no mundo através da dominação pois reconhecemos que existe uma inteligência viva. O mundo deixa de ser uma aleatoriedade errante e passa a ser um organismo vivo e inteligente. O planeta passa a ter uma essência e um sonho.
O nosso papel, então, é contribuir para a realização deste sonho. Abdicamos do nosso ímpeto colonizador, aquele que quer conhecer para dominar, e reconhecemos Gaia. Ao reconhecer Gaia, nos percebemos enquanto co-criadores da vida.
O nosso objetivo, então, é participar de forma apropriada. Observar, ouvir, sentir, pensar… para então contribuir. Contribuir com Gaia, que é, de fato, contribuir com nós mesmos.
Foto: Christopher Alvarenga