
Foto: Carlos Magno
O movimento regenerativo é um campo povoado por diferentes entendimentos, muitos deles associados a uma visão genérica de “um mundo mais ecológico”. O desenvolvimento regenerativo faz parte desse movimento mais amplo e contribui com ele oferecendo uma perspectiva particular de regeneração, partindo da premissa de que “o que faz algo regenerativo em seus efeitos é a aplicação de um pensamento regenerativo”.
Reunimos algumas ideias nesse pequeno texto para compartilhar com você algumas das particularidades do desenvolvimento regenerativo e do tipo de mudança que essa abordagem busca provocar.
Após décadas de estudo dos padrões que sustentam a vitalidade e a evolução dos sistemas vivos, e da observação desses mesmos padrões em territórios e comunidades, o grupo Regenesis propõe a seguinte definição:
Regeneração é a construção de relações sinérgicas entre sistemas humanos e naturais, através das quais os atores e iniciativas locais, a partir de seus papeis singulares, contribuem para a saúde, resiliência e evolução do seu lugar.
Regeneração não é, portanto, um novo nome para sustentabilidade, nem um rótulo para melhorias incrementais. Não se trata de “fazer o bem” ou gerar “impacto positivo”. A regeneração está relacionada à presença e recuperação da vida e da vitalidade de um sistema como um todo, e exige um compromisso com os processos sistêmicos e dinâmicos que acontecem ali.
Por isso, não faz sentido dizer que um produto, entrega ou mesmo projeto é regenerativo por definição. O caráter regenerativo se expressa na atuação que o projeto tem no território, ou seja, na forma como contribui para fortalecer as condições que sustentam a vida no contexto de que faz parte. O que se busca regenerar, portanto, é a capacidade do sistema em que se atua sustentar e desenvolver processos vivos e evolutivos — o que se dá por meio do fortalecimento de relações e de processos sinérgicos entre diversos atores, cada um desempenhando seu papel único na evolução do lugar que compartilham.
Uma definição complementar:
Regeneração é a prática de devolver vida, energia ou espírito a pessoas, organizações, projetos, comunidades e territórios que tiveram o seu propósito deteriorado, buscando abordá-los na sua complexidade e dinamicidade.
Sendo a vida o processo de tornar-se, a regeneração é o processo através do qual um sistema vivo retoma seu caminho de evolução no sentido de ampliar sua capacidade de auto-manutenção e auto-criação.
Sistemas vivos evoluem quando realizam novos potenciais em benefício próprio e de seu entorno. A expressão desses potenciais depende, assim, tanto do propósito e do imperativo interior do próprio sistema (de si mesmo) quanto da condição de saúde e das possibilidades do sistema maior no qual ele está inserido.
Nesse sentido, podemos dizer que a força que move a regeneração vem simultaneamente de dentro e de fora: é o impulso auto-dirigido de um sistema para se desenvolver a partir de sua singularidade, contribuindo para a saúde e o desenvolvimento do todo maior a que pertence — e assim sucessivamente, através das múltiplas escalas dos sistemas aninhados.
Como a regeneração é o efeito da capacidade de auto-organização e autodeterminação dos sistemas vivos, ela nunca pode ser forçada ou imposta. Mas ela pode ser catalisada por intervenções inteligentes em uma sequência correta. Quando fazemos intervenções apropriadas em pontos estratégicos das redes existentes em um lugar aumentamos a chance de produzir efeitos sistêmicos que serão percebidos ao longo das diferentes escalas deste sistema. Assim, o trabalho regenerativo pode ser entendido como o esforço em promover uma regeneração sistêmica, possível quando há:
Recuperação da vontade dos diferentes atores de um território em se engajarem em ações que constroem capacidades nos sistemas sociais e ecológicos locais.
Quando essa visão de regeneração se insere nos espaços de tomada de decisão, planejamento e design, ela é capaz de gerar efeitos concretos e profundos sobre como atuamos em projetos, organizações e comunidades. Mas também exige um investimento genuíno em aprender esse novo modo de pensar e colocá-lo em prática. Trata-se de uma prática que implica processos desenvolvimentais, construção de capacidades, engajamento contínuo e criação de condições para a evolução.
No caminho nos deparamos com níveis altos de complexidade social que impõe a necessidade de considerar genuinamente a motivação e aptidão das pessoas, construir entendimento mútuo nas equipes de trabalho, conciliar diferentes interesses, trabalhar através das escalas incluindo atores e sistemas que costumam ser ignorados às custas da agilidade e praticidade… E, sobretudo, manter viva a intenção de alinhar nossas formas de pensar e agir no mundo com a inteligência da vida.
Quando conseguimos isso, ajudamos a despertar nas pessoas o senso de cuidado e pertencimento em relação aos sistemas e lugares que sustentam e nutrem sua existência. Se esse sentido de cuidado e cooperação é despertado e direcionado para a realização de um trabalho em rede, podemos dizer que fomos bem sucedidos e fizemos um trabalho regenerativo.